quarta-feira, 1 de outubro de 2008

A PEDAGOGIA EM PORTUGAL **

Mensagem recebida via
educacao-em-portugal.blogspot.com:
Agradecia um comentário, do ponto de vista de um psicólogo.
O meu filho diz que eu não descobri nada, está tudo nos livros, por isso acrescentei a referência ao livro (o qual não li :-) ).
Cumprimentos
J. C.” 
(José Carrancudo)

Caro José,
Tendo recebido, há dias, a sua missiva que muito me honrou e satisfez, senti necessidade de tomar conhecimento de outros posts que poderiam ser úteis para a minha compreensão e resposta.
Contudo, não consegui saber a que livro se refere.

O comentário que me pediu para fazer vai ser apenas a nível opinativo com base na minha prática clínica de psicologia, psicoterapia e psicopedagogia que tenho exercido nos últimos 30 anos. Isto quer dizer que durante todo este tempo colaborei com a minha mulher, professora do ensino secundário e empenhada na reeducação e integração de crianças com dificuldades no ensino regular.
Quando nós dois aprendemos a ler, foi através do reconhecimento das letras e formação de sílabas.
Quanto aos nossos filhos, foi a mãe que lhes ensinou a conhecer e reconhecer as primeiras letras, a formar sílabas, palavras e frases. O mesmo não posso dizer dos meus netos que, ao atingirem a idade escolar, aprenderam a ler pelo método visual (global?). Actualmente, apresentam por vezes, algumas dificuldades na leitura.
Utilizando somente a calculadora, também lhes fez falta não decorar e não memorizar a tabuada.
Também diversas outras noções adquiridas noutros conhecimentos, foram apenas através da memória, frequentemente, sem compreender o que estávamos a ler, decorar e estudar: era uma espécie de repetição tipo papagaio. Não gostamos, a não ser quando conseguimos ver e compreender as coisas, com a lógica e a prática necessárias.
Até aos cinco anos de idade não falei outra língua senão o português. Depois, comecei a frequentar uma escola inglesa e tive de me adaptar à língua inglesa que era obrigatoriamente falada na escola. E em casa dos avós, quem, para além da família, me entendia bem se não falasse concani? Não foi uma adaptação fácil mas possível e necessária devido às necessidades do momento. Por isso, as necessidades linguísticas dos nossos emigrantes não me parecem difíceis de ultrapassar com um pouco de boa vontade e persistência que, logicamente, exige memória.
Se no PPCI exigem a criatividade e a crítica, de que maneira será possível criticar aquilo de que não se tem memória? Sem memória como podemos recordar aquilo que aconteceu anteriormente? Quanto melhor ela for, mais segurança podemos ter naquilo que fazemos. A memória é tão importante que até na reeducação utilizamos frequentemente exercícios de treino e prática da mesma.
Ao longo da vida, as crianças vão formando e estruturando a sua personalidade ou a sua «maneira de ser», geralmente, através dos modelos dos pais. Seguramente, não basta imitá-los no momento em que eles estão a actuar. Como poderemos imitá-los em momentos posteriores, se não nos lembrarmos dos seus comportamentos? A memória não será uma componente fundamental nessa aprendizagem como em muitas outras?
Em quase todos os aspectos da vida temos de utilizar a memória. Senão, qual a razão de dizermos que uma pessoa está «a degradar-se» quando começa a entrar na «doença de Alzheimer»?
Se vamos por um caminho e não nos lembramos dele, como poderemos ter a possibilidade de regressar? A memória não será fundamental para isso? Se tivermos uma boa memória da «disposição» dos aposentos da nossa casa, podemos chegar com pouca dificuldade ao quadro de electricidade quando a luz se apagar. Numa residência nova para nós, talvez seja mais difícil por não nos lembrarmos bem da disposição das instalações.
Nos primeiros tempos em que estive na navegação, aproveitei a memorização da mnemónica GOAT (Greater Observed Altitude Towards «the substellar point») que os navegadores treinados no Canadá utilizavam para verificar facilmente a nossa posição no ar em relação à terra.
Quando estive a leccionar Matemática aos alunos do 5º ano (antigo 1º ano do ciclo preparatório), eles tinham dificuldade em fixar a ordem de resolução das operações nas expressões numéricas e como estávamos numa época de turbulência política, ajudei-os a utilizar a mnemónica PPD/MAS (Parêntesis, Potências, Divisões, Multiplicações, Adições e Subtracções). Assim, reduzi a necessidade de memorizar a sequência das operações com uma mnemónica que era mais fácil decorar e memorizar do que as operações em si e ajudei a poupar a memória.

Se eu não utilizasse a lógica, talvez não conseguisse fazer esta comparação mas seria possível fazê-la se não me lembrasse dos eventos que relatei?
Do mesmo modo, porquê fazer um drama quando uma pessoa tem um acidente e se esquece do que aconteceu? Ela continua a viver física e fisiologicamente, mas pode não se lembrar dos conhecidos, amigos e até dos familiares. Pode não se recordar de muitas coisas da sua vida. Se a memória não é importante porquê tentar a sua reabilitação? Se a reabilitação é boa, qual a razão de não a fortificar? O treino é fundamental. Se o mesmo se puder fazer através dos estudos ou até para melhorar a sua eficácia, estamos a juntar o útil ao necessário e futuramente proveitoso.
Se em psicoterapia eu não tentasse avocar a memória dos «pacientes», como poderia incitá-los a reviver os momentos da sua vida mais interessantes, importantes e agradáveis? Se tiveram um bom sucesso num determinado momento e se esqueceram dele, porque não o reavivar
para poderem extrair dali um outro modelo possível para o futuro? Esses factos estão apenas no seu «arquivo pessoal» aos quais não chegaríamos se não houvesse memória.
Desprezar, minimizar ou ignorar qualquer das nossas capacidades ou não tentar optimizá-las quando possível, parece-me um erro crasso. Senão, para quê a reeducação e a reabilitação dos deficientes? Porquê o atletismo e a demonstração da maximização de determinadas capacidades? Podemos não ser e até, talvez, não devamos ser radicais. Mas potenciar tudo o que é favorável para o bem-estar humano julgo ser digno de louvor.
Contudo, devemos adaptar-nos às situações da maneira mais conveniente. Por isso, eu tento não utilizar cegamente uma determinada linha terapêutica mas procuro adaptar-me às necessidades do paciente. Do mesmo modo, no ensino, julgo que é ao professor que compete utilizar as técnicas necessárias em cada situação de
acordo com o «material humano» que tem entre mãos. Porém, nada impede que a orientação geral
seja unânime para todos, com definição de objectivos.
Por isso, parece-me que um treino multifacetado dos docentes pode dar origem a um ensino mais criativo, crítico e desenvolvimentista.
Do meu ponto de vista, quanto mais se desenvolverem as capacidades humanas, sem sobrecargas ou radicalismos, melhor se poderá aproveitar o potencial de cada um de nós.

Provavelmente, se quiser, diremos alguma coisa sobre disciplina, stress e aprendizagem.
Cumprimentos,
Mário de Noronha

Em 2018, já existe na colecção da Biblioterapia o 18º livro «PSICOTERAPIA… através de LIVROS…» (R),
destinado a orientar os interessados para a leitura e consulta adequada de livros, desde que desejem enveredar por uma psicoterapia, acções de psicopedadogia, de interacção social e de desenvolvimento pessoal, autonomamente ou com pouca ajuda de especialistas. 

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Blogs relacionados:
TERAPIA ATRAVÉS DE LIVROS para a Biblioterapia

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4 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

Como sou professor, o sossego do fim-de-semana levou-me a este post que me conduziu, por curiosidade ao compincha.blogspot.com
Nesse blog, que parece funcionar aos sacões, gostei de ler especialmente os posts MILAGREIROS E TRAPACEIROS, O CUSTO/BENEFÍCIO, A ECONOMIA DEBILITADA, RES NON VERBA e OS DIRECTORES GERAIS «ESPECIAIS».
Essa leitura conduziu-me, de novo a este blog para ler DESABAFO.
A memória, especialmente a de certos políticos é, de facto, muito curta, ou eles sabem representar muito bem o seu papel.
Se calhar, enganaram-se na profissão ou não conseguiram ser actores.

Anónimo disse...

Também sou professor e estou numa escola onde não existe qualquer psicólogo que dê apoio aos alunos e professores.
Por isso, gostaria de saber a sua ideia sobre a disciplina e stress, especialmente dos professores já que, com a indisciplina, os alunos devem descarregar o seu.
Nas terras mais «mais escondidas», quer o «Magalhães» quer o «Sócrates» são a nossa única companhia e consolação.
Viva a INTERNET!

Anónimo disse...

Quando li este post, do qual gostei muito, lembrei-me das conversas dos políticos e, especialmente, da nova estrela do PSD.
Oxalá que ela não tenha aprendido pelo método global (ou visual?).
Entrei no blog "compincha.blogspot.com" para dizer o que penso aconselhar ao meu amigo "cão" a fazer no dia das eleições.